"O CRISTO DOS HOMENS CONTRA O CRISTO DE DEUS"
Mesmo depois de três anos andando com a Palavra Encarnada, interpretada, feita movimento, gesto, modos, consciência, ensino, acolhimento, repreensão, explicação, e, sobretudo, declarações que não enganavam quanto ao fato de que o Filho do Homem seria preso, humilhado e morto; porém que ao terceiro dia ressuscitaria —; tais conteúdos e percepções anda assim foram insuficientes para desinstalar da alma judaica dos discípulos, de todos eles, as certezas fabricadas pelos rabinos de Israel, acerca de “como” seria o Messias, e de que “modo” Ele os livraria.
Na realidade, considerando-se a cultura judaica de então, não se sabia separar um Messias Redentor de um Messias Rei e Libertador Político do povo.
Será esse o tempo em que restaurarás o reino a Israel? — Era a pergunta recorrente, tanto antes da Cruz como também depois da Ressurreição.
Tanto na conversa dos dois que seguiam desolados para Emaús, no domingo fatídico apenas para os que não haviam dado crédito ao testemunho das mulheres que já O haviam avistado ressurreto; tanto quanto também até nos momentos anteriores à Sua ascensão aos céus — e, diga-se de passagem: após quarenta dias lhes falando a cerca do “reino de Deus” —, ainda assim, a questão perdurava e insistia: Será esse o tempo em que restaurarás o reino a Israel?
É verdade que Jesus nunca negou que um dia Israel seria restaurado de modo histórico, após o tempo dos “gentios” se consumar. Além disso, após falar do Israel-Subjetivo, feito de todos nós, os que cremos, Paulo retoma o tema da conversão do Israel Histórico, posto que, é totalmente impossível fazer de conta que Israel deixou de ter seu papel importantíssimo na configuração dos cenários proféticos da Escritura, os quais, tanto foram reafirmados por Jesus, como também por Paulo.
No entanto, a questão no momento não é esta. Neste momento o que me importa é afirmar o poder da Doutrina Religiosa contra a Revelação Encarnada.
Sim, porque mesmo seguindo a Palavra Viva e Andante; e vendo, ouvindo, sentindo, cheirando, e vivendo com o Verbo Jesus; os discípulos pareciam incapazes de se desligar da idéia do Messias fabricado pela religião, bem como, mostraram-se tão pré-condicionados a ver, de modo escatológico, uma certa forma de necessidade de manifestação messiânica por parte de Jesus, que, mesmo sendo ensinados no oposto, quando houve a “desconstrução-da-cruz”, seus olhos se cegaram e seus ouvidos nada mais ouviam de todas as palavras e ensinos recebidos no caminho.
“Ó néscios e atrasados de coração para crer!” — disse-lhes Jesus, para então, usando-se como “chave hermenêutica”, expor-lhes as Escrituras e abrir-lhes o entendimento. Porém, por mais que lhes tenha aberto o entendimento para verem que Ele tinha que morrer e ressuscitar, ainda assim a questão perdurou até o fim; e perdura até hoje.
E mais:
Nem os quarenta dias de ensino do Ressuscitado aplacou neles a necessidade político-ideológica de terem “algum material concreto” na mão como “escatologia” e certeza do futuro.
Será esse o tempo? — querem saber antes e depois de tudo; e insistem nisso até a ultima hora.
E, aqui, quero apenas, a fim de simplificar ao máximo, dizer duas coisas:
1. Uma das tarefas humanas mais árduas é deixar de lado o “Deus fabricado” pela religião, com as certezas concretas que seus sistemas e esquemas de “agenda de Deus” oferecem; a fim de, sem nada, apenas seguir a Jesus, sem questões, sem saber quando Ele vem, mas apenas levando na alma a simplicidade do mandamento de amar e de anunciar a Boa Nova a todos os homens. Digo isto porque se aqueles discípulos originais, que viveram dia e noite com a Palavra Interpretada, Jesus, ainda assim mantinham a força das idéias da religião sobre qual deveria ser a expectativa acerca do Messias, e isto contra o próprio ensino de Jesus — o que dizer de nós? Sim, de nós que nada sabemos de nada, que cremos no “evangelho” pelas mãos de terceiros, e que quase nunca nos damos o direito de “esquecer” todo o pré-condicionamento doutrinário da religião, a fim de buscarmos ficar em solidão existencial com a Palavra, e com a coragem de perguntar a nós mesmos se cremos no que fomos doutrinados a crer; ou se cremos naquilo em que realmente cremos, por nós mesmos; e conforme Jesus e o Evangelho?
2. Ora, quando se olha para os evangelhos, e se sabe que em Jesus estava a Interpretação da Palavra — não apenas em Suas palavras, mas em tudo o que fazia —, vê-se, por simples comparação, a quantidade enorme de fabricações humanas acerca de “Deus”, de “Jesus”, da “Igreja”, da “Bíblia”, da “Eclesiologia”, da “Escatologia”, da “Sotereologia”; e de um monte de coisas tidas como “sagradas”; mas que nada mais são do que construções humanas, e que ganharam o peso de “interpretação autorizada”. Ora, é por essa “cartilha-catecismo-humano”, que tem-se que enxergar Deus, Jesus, a Verdade, e qualquer outra coisa; posto que, supostamente, fora dessa câmara de pensamentos feitos “divinos” por reis e teólogos-filósofos a serviço dos principados humanos — com seus muitos e variados interesses de poder, e que, pela ignorância ou pela mera insegurança pagã nos possuíram a alma —, nada se pode crer ou saber; visto que tais “santas produções”, ganharam no coração da maioria o status de “sã doutrina”. Assim, tem-se a Escritura; porém, mesmo que se mande que se a leia em casa, não se permite que tal liberdade vá além da leitura do livro, de modo mágico, devocional (na melhor das hipóteses); pois, de fato, é somente o “interprete credenciado” pela oficialidade religiosa quem, alegadamente, de fato sabe o que Deus disse ou não; e isto sempre conforme o “Jesus” criado pelos homens; e à semelhança do Messias construído no imaginário dos judeus dos dias de Jesus; a ponto de que até os Seus discípulos guardaram as “certezas antigas” de triunfo-messiânico-imediato, conforme a religião; apesar de Jesus lhes haver dito que AGORA não seria assim. Este é o poder devastador e frustrante de tais produções, quando tomam o lugar da Palavra em nós.
Desse modo, com essa simples ilustração, gostaria que você se perguntasse o quanto do que você pensa que sabe e crê do ou no Evangelho, é algo que vem direto da interpretação da Palavra vista em Jesus por você; e o quanto é fruto da “invenção de Cristo”, conforme os dogmas e doutrinas da religião.
Você tem essa coragem?
Nos últimos trinta anos eu fiz o cansativo trabalho de buscar sempre interpretar a Palavra através de Jesus e não Jesus através da Escritura; e, no processo, e ainda hoje, aqui e ali, me vejo linkado a coisas que eu sei que são apenas formatações humanas; as quais, às vezes, podem até ser coisa de natureza prática, mas que são “sentidas” como algo parecido com um mandamento; embora nada mais sejam do que o produto da conveniência de certos momentos históricos; ou, outra vezes, apenas o resultado do que se poderia saber e discernir à época; mas que não é a Palavra, sendo apenas uma circunstancialidade, boa ou má, transformada em mandamento sistematizado ou em dogma irrefutável.
Um conselho:
Antes de ler comentários bíblicos, leia livros históricos, e que abrem a cultura dos dias de Jesus, e que mostram o que cada personagem ou grupo humano mencionado nos evangelhos significava naqueles dias, pois, de outra forma, não se tem como discernir a profundidade da simplicidade do Evangelho e nem tampouco a visceralidade da ruptura que ele anuncia e propõe.
Quem não tiver a coragem de largar da barra da saia dos escribas dos fariseus e chefes do templo, e apenas seguir, na santa ignorância, apenas o Evangelho, esse não conhecerá Jesus, a Palavra, mas tão somente o “seu” simulacro; o qual é construção de ídolos, conforme qualquer lugar onde deuses são forjados para consumo humano.
Nele, que é um só,
Caio
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