“FUGIR DO ÓBVIO OU ACEITAR UMA VIAGEM PELA MENTE DE PAULO!”
“O óbvio é a verdade mais difícil
de se enxergar “ - Clarice Lispector
Não é de se admirar que Paulo tenha declarado que a letra mata,(2 Coríntios 3:6) e que levada ao extremo da cega interpretação pode matar até aquilo que é obvio subscrito pela própria letra como é o caso de suas cartas às comunidades dos irmãos de sua época.
Subscrevo esse texto abaixo pois considero uma excelente reflexão para
quem ousa desfazer as amarras doutrinais
ou dos usos e costumes que em nome dos
escritos de Paulo se tornaram normas no
cotidiano da maioria dos cristãos espalhados pelo planeta terra.
Se Paulo ressuscitasse hoje,ele ordenaria: -Eu
desamarro essas amarras pelas quais me quiseram amarrar! Rs,rs,rs,…
Segue então o texto de
Caio Fábio:
Acho que já deu para todo mundo
notar que eu não concordo com Friedrich Nietzsche quando acusa Paulo de ser o
fundador do “Cristianismo”.
A Basílica é de São Pedro, não de São Paulo!
Paulo perdeu a “parada” na construção do
“Cristianismo” simplesmente porque o que Paulo discerniu, creu, ensinou e
praticou, jamais criaria um “Cristianismo”, mas tão somente igrejas que se amavam, se
correspondiam, se comunicavam, e se sentiam parte do Corpo Universal de Cristo.
Essas igrejas não deixavam de ser o que eram e
nem as pessoas quem eram nas circunstancias de suas vidas e culturas, visto que
não haveria nunca nenhum poder humano, central ou regional, que fizesse ninguém
dominar sobre ninguém, ditando ensinos de homens e revelações do ego, pois,
Cristo é o Cabeça do corpo e Nele temos o Amém de Deus — conforme Paulo!
Além disso, não haveria uma profissão
teológica a ser buscada e nem um status profético de detentor de novas
revelações a ser alcançado, pois, em Cristo, todos os tesouros da sabedoria e
do conhecimento já haviam sido revelados.
O apostolo também cria que o mistério desse
crer e saber geraria um sentir de almas unidas no amor de Cristo. E, assim, o
mundo veria a presença do reino de Deus.
Ele também cria que esse testemunho tinha que
ser dado dentro do contexto onde a Palavra estava sendo anunciada. Assim, para
os judeus ele era escândalo entre os gentios!
Para os gentios ele não era um escândalo entre
os judeus, quando raspou a cabeça, tomando voto. Afinal, quando alguém faz
parte de uma cultura onde a revelação se originou, pode passar a pensar que sua
cultura e sua história são santas também. E os que souberam depois—os gentios,
no caso—sentem-se privilegiados em poder ter algum contato com a “cultura
original”, como o fazem os católicos e evangélicos quando beijam o chão de
Israel!
Hoje a exemplificação também vem dos novos
convertidos evangélicos que recebem a Jesus e tem que "engolir" o
pacote como se tudo fosse o evangelho, até o jeito de falar ou vestir!
O engano é pensar que quem chegou antes já
discerniu mais. Paulo nuca creu nisso. Por isso mesmo botou Pedro sob a Graça e
enfrentou tudo e todos pela verdade do Evangelho.
Nisto ele também se gloriava.
Dois mil anos depois...
Já para nós, em certas coisas, temas e
circunstancias da vida, Paulo parece um pouco de menos para os liberais e um
pouco demais para os conservadores—e nada para os neopentecostais!
Para nós Paulo é tão demais ainda que o
“demais” de Paulo, pouca gente tem enxergado.
E Paulo apesar de saber que era demais, era
para si mesmo tão de menos, que nunca pensou que sua pessoa fosse ficar nada
além do que nele se via e dele se ouvia!
Mas a mediocridade se aferra às
circunstancialidades do “aplicativo” do Princípio da Palavra em Paulo e não
cresce no Principio da Palavra a fim de fazer seu “aplicativo” no momento
histórico em que se está vivendo.
Assim, o Universal em Paulo se reduz a slogans
e o “aplicativo circunstancial” se transforma é “principio universal”.
Alguns exemplos.
Primeiro os slogans que sobraram:
Pela Graça sois salvos!—para os Reformados.
Não me envergonho do Evangelho!—para os
Missionários.
Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em
mim!—para os Santificados.
Dou Graças a Deus porque falo em línguas mais
do que todos vós!—para os Carismáticos.
Tudo é vosso!—para os liberais.
Todas as coisas são puras para os puros!—para
quem gosta daquilo que a maioria diz não poder ou gostar.
Não é bom para o homem o comer com
escândalo!—para quem anda doido para fazer alguma coisa e tenta se controlar.
O bispo seja marido de uma só mulher!—para
aquele que tem um medo horrível de gostar tanto de pregar quanto gosta de
mulher.
O bispo governe bem a sua própria casa!—para o
líder que acha que consegue manter os filhos escondendo bem seus próprios
corações.
Há muitos outros slogans!
Outro dia eu volto a eles.
Agora os aplicativos.
Ora, os aplicativos são tantos que eu vou
deixar a expansão deles para outra hora. Aqui vou apenas dar alguns poucos
exemplos.
Vejamos:
O bispo seja marido de uma só mulher!—porque
no principio Deus criou Adão e Eva, não Adão e suas mulheres. No entanto, Adão
caiu e o mundo de Paulo não era o jardim do Éden.
Portanto, a fim de que o Evangelho fosse boa
notícia para todos—incluindo os que tinham mais de uma esposa ou mulher quando
conheceram a Palavra—, Paulo recomenda que o bispo seja o referencial desse
novo modelo.
Afinal, não há homem nem mulher (Gl 3:28).
E o homem que não quiser sua mulher pensando
como ele, que pense como ela.
E assim, haverá igualdade.
Mas o mundo é caído!
Cada geração tem que entender e saber
recomeçar sem negociar com o Princípio da Palavra.
O aplicativo carrega o Princípio, mas não pode
ser instituído como forma.
Mais algumas acusações feitas ao irmão Paulo.
Ele é acusado de ter inventado o “bispo” (que
era bispo de casas de fraternidade, o outro nome é igreja, e não essa figura
estereotipada de hoje), a “hierarquia” (que era orgânica e não funcional), o
“silencio das mulheres” (que era cultural), o tom agressivo (que era o mínimo
que ele poderia fazer considerando a dor das circunstancias), a lógica na
argumentação (porque ele era inteligentíssimo), a independência excessiva
(porque ele cria, não duvidava e não tinha medo), etc...
Para mim, sinceramente, ele é o homem que
discerniu e explicou a razão da esperança melhor que ninguém. Isso ninguém pode
negar!
Mas se Paulo tivesse sido entendido nos
Princípios Essenciais da revelação que transmitia, a história teria sido
possivelmente outra, em razão de que a essência do que Paulo ensinou não
criaria o que o “Cristianismo” se tornou, em qualquer de suas variáveis.
Perfeito nunca seria—somos caídos e Paulo se
considerava o principal entre os pecadores—, mas seria muito mais
revolucionário!
E não haveria uma Basílica que representasse o
Templo de Jerusalém sendo erguida em nome da fé em Jesus!
Mas também não haveria o Protestantismo.
Paulo não era um protestante, ele era um
inconformista.
Ele jamais proporia uma Reforma. Ele cria em
subversão, em revolução permanente, em nunca se conformar com este século e
suas produções, ainda que teológicas.
A fé de Paulo estaria em permanente estado de
crescimento: tanto no conhecimento de Deus, como em auto-percepção e em
discernimento da natureza humana--e também da natureza!
O que a gente não entende quando lê a Palavra
em Paulo é que ali há a revelação eterna, e que ela está sendo enviada
ignorantemente —como convém à piedade—na forma de cartas para pessoas que se
reuniam em casas, e que tinham nomes semelhantes a Fernando, Mara, Suzana,
Antônio e Suzane, Maria Helena, Alfredo, Sergio e Débora, Raimundo e Murilo.
Ou seja:
Paulo sabia que o que dizia era a Verdade do
Evangelho de Cristo. Ele não tem nenhuma dúvida a respeito da revelação
recebida.
Quando ditava algo ou escrevia para enviar aos
Efésios, Romanos, Filipenses, Coríntios ou qualquer outra cidade, poderia
também ser Rio de Janeiro, São Pedro, Curitiba, Teresina e Sobral do Ceará.
Ele era responsável eternamente pelo que
ensinava acerca do Evangelho e, ao mesmo tempo, completamente solidário e
participe do momento e das circunstancias das vidas de seus ouvintes.
Ele sabia que o que dizia era o Evangelho e
que o Evangelho não era nada mais nem menos que aquilo.
Ele só não sabia era que sua “correspondência”
iria ser lida durante dois mil anos, todos os dias—especialmente aos domingos—,
por milhões, bilhões de seres humanos, e que essas pessoas iriam pensar que
todas as soluções imediatas que ele, Paulo, buscava alcançar no “aplicativo” do
Principio Universal do Evangelho, iriam se transformar em “conteúdo fixo” do
evangelho, e que viria a ser ensinado como “mandamento para todas as culturas
dos gentios da terra”.
Logo ele? Que lutou contra isso o tempo todo?
Tendo feito mais inimizades por causa disso do que por qualquer outra razão
entre os judeus ou entre os cristãos judaizantes!?
Não!
Paulo jamais gostaria que o carioca fosse como
os gregos e pernambucanos como os holandeses, e os paulistas como italianos!
Paulo estabeleceu os Pontos Ômega e fez
aplicação circunstancializada dos Princípios, conforme o aplicativo pertinente
ao contexto.
Aquelas coisas eram importantes naquela hora,
mas não dava para comparar com Bem do Evangelho.
E, à semelhança dele, Paulo cria que cada
geração iria ter que reconhecer também, como ele mesmo pediu a Timóteo que o
fizesse—em suas ações, atitudes, amor, longanimidade, fé, pureza, saber, e
também pelas armas da justiça, quer ofensivas, quer defensivas; por boa fama e
por desonra; como quem morre, mas eis que vivo está!—, o significado de crer no
Evangelho de Jesus!
“Em Cristo não há homem, nem mulher; nem
escravo, nem liberto; nem judeu, nem grego”—foi o que ele disse.
Isto é Universal.
É! Em Cristo!
Voltamos dois mil anos...
Havia um monte de gente vivendo em Corinto.
A cidade era portuária e o verbo corintianizar
era sinônimo de tudo o que os cariocas são no imaginário universal: o povo da
boa vida, do prazer e do momento de alegria.
Em Corinto as prostitutas cultuais desciam da
Acrocorinto com o rosto nu e as roupas apenas em suficiência para aumentar a
sedução.
Uma mulher que tivesse marido e fosse fiel a
ele deveria se diferenciar desse paradigma com “autoridade”—e a expressão
simbólica da mulher que não gosta que fiquem gritando nas costas “sua
gostosa!”, naquela época, era botar o véu sobre a face.
Se no Brasil esse sinal fosse respeitado, muitas
mulheres usariam véu, se a percepção cultural das pessoas fosse idêntica.
Naquele tempo o véu era o sinal vermelho para
qualquer pretensão.
Hoje se puser o véu a “rapaziada” arranca e se
não ouvir um sonoro “me deixa em paz”, nem sempre desiste.
O problema é que em Corinto se o que
funcionasse fosse o “me deixa em paz”, Paulo iria dizer:
“Irmãs, diferenciem-se, numa circunstancia
dessa, dizendo “me deixe em paz”.
Mas era o véu que respeitavam.
E respeitavam-no porque aquela mulher tinha
“dono”.
Era a percepção “para fora”.
Para o lado de “dentro” Paulo diz que o “dono”
daquela mulher não deveria fazê-la sua propriedade a fim de
abusar dela.
Afinal, a mulher saiu do homem, mas o homem
nasce de mulher.
E assim como o homem é a gloria de Deus, assim
também a mulher é a gloria do homem!
E olhe que para Paulo a palavra gloria
significava gloria!
(Falaremos disso noutra ocasião).
Resumindo:
Coisas do dia a dia se transformaram em lei de
conduta entre os cristãos.
E nas cartas inspiradas enviadas aos amigos e
irmãos da comunidade, até os nomes das pessoas mencionadas são vistos como
especialmente eleitos como santos e parte da revelação.
Essas pequeninas coisas é que obscurecem as
Universais!
Sabe o que é isso?
É nunca ter entendido a Palavra.
Paulo mesmo disse que a letra mata--até mesmo
nas cartas de Paulo!
Quem já conheceu o irmão Paulo não fica mais
com esse problema.
Sabe que Paulo era absolutamente certo de ter
crido e processado a Palavra da Verdade da Graça de Deus revelada em Seu Filho
Jesus Cristo.
Sabe que tudo isso é decisão de Deus.
É mistério.
Cristo é a Revelação.
O Evangelho é a Boa Noticia, mas não se
encerra numa única explicação cultural. Não se deixa prender nem por judeus,
nem por gregos, nem por americanos, ingleses, brasileiros ou até mesmo
argentinos (o “até mesmo” revela meu mergulho no momento histórico emocional
brasileiro de fazer piadas com argentinos). Certo?
Caio Fábio
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