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Big Brother. Do vazio para o vazio

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  Há uma parte da população que passa horas a ver Big Brother como quem vigia um aquário: rostos presos numa rotina de nada, gestos repetidos, discussões vazias transformadas em espetáculo nacional. É uma escolha fácil, quase automática — uma fuga cómoda à exigência de pensar, sentir, questionar. Como se a vida alheia, reduzida a fragmentos de drama barato, pudesse preencher o vazio que cada um evita enfrentar dentro de si. E o que acrescenta isto a quem vê? Pouco mais do que uma sensação provisória de pertença, uma ilusão de importância no ato de julgar outros. É uma espécie de anestesia social: distrai, ocupa, mas não transforma. Alimenta-se da curiosidade mais básica e devolve apenas um espelho baço onde todos parecem iguais — cansados, previsíveis, desligados da própria consciência. E o que diz isto sobre nós? Diz que vivemos num tempo em que observar vidas vazias é mais fácil do que preencher a própria. Diz que a superficialidade ganhou lugar de culto. Diz que o público procur...

O Infinito Escondido no Número π

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  O Infinito Escondido no Número π O número π (pi) é um dos maiores mistérios e fascínios da matemática. Representado pela letra grega π, ele expressa a relação entre a circunferência de um círculo e o seu diâmetro. Não importa o tamanho do círculo — de um átomo a uma galáxia —, essa razão será sempre a mesma: aproximadamente 3,14159... Mas o enigma do π vai muito além dessa definição simples. Ele é um número irracional, o que significa que não pode ser expresso como uma fração exata, e seus dígitos decimais se estendem infinitamente, sem nunca se repetir em um padrão. Até hoje, supercomputadores já calcularam trilhões de casas decimais de π, mas seu “final” jamais será encontrado — porque simplesmente não existe. Outro detalhe intrigante é que, apesar de sua origem geométrica, π aparece em áreas inesperadas: na física quântica, na teoria da relatividade, na probabilidade, nas ondas eletromagnéticas e até na estatística. É como se π fosse uma linguagem secreta do universo, escondid...

Eu e as Inúmeras Almas de Impulsos Cruzados

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 "Vivem em nós inúmeros;   Se penso ou sinto, ignoro   Quem é que pensa ou sente.   Sou somente o lugar   Onde se sente ou pensa.  Tenho mais almas que uma.   Há mais eus do que eu mesmo.   Existo todavia   Indiferente a todos.   Faço-os calar: eu falo.  Os impulsos cruzados   Do que sinto ou não sinto   Disputam em quem sou.   Ignoro-os. Nada ditam   A quem me sei: eu escrevo." 13 - 11 - 1935  Ricardo Reis “Fernando Pessoa, Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Ricardo Reis and Bernardo Soares in a Lisbon bar”  Subscrito  Bonani 

Quem somos quando nada mais dura?

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  Vivemos tempos líquidos - dizia Bauman, e essa liquidez não é apenas uma metáfora bonita, mas um diagnóstico do modo como tudo escorre por entre os dedos. Nada mais permanece. Relações, valores, identidades, até os sonhos... tudo se dissolve na velocidade com que deslizamos a tela do celular. A modernidade líquida é o império do instantâneo. O amor precisa ser rápido, o prazer imediato, o sofrimento breve. Somos ensinados a trocar antes de consertar, a seguir em frente antes de compreender, a desejar sem sequer saber o que realmente queremos. E nessa busca por liberdade total, acabamos prisioneiros de um vazio que nos consome em silêncio. Bauman nos alerta: a liquidez prometia leveza, mas trouxe instabilidade. O que antes era chão, hoje é areia movediça. O eu tornou-se um projeto inacabado, constantemente refeito conforme a moda, a opinião ou o algoritmo. A fluidez virou disfarce para o medo - medo do compromisso, da perda, da entrega. Mas talvez a pergunta mais profunda que essa...

Correr no Sentido Anti-horário

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  Você já se perguntou por que os corredores sempre circulam a pista no sentido anti-horário? A razão por trás dessa prática está enraizada na história, na ciência e até mesmo em padrões naturais. Surpreendentemente, nem sempre foi assim. Mais de um século atrás, os atletas corriam na direção oposta — no sentido horário. Nos primeiros Jogos Olímpicos modernos em 1896, realizados em Atenas, eventos como os 200m, 400m e 800m eram todos realizados no sentido horário ao redor da pista. No entanto, os corredores logo começaram a sentir desconforto e até mesmo dor ao correr nessa direção. Alguns atletas relataram tensão em certos músculos e articulações, principalmente na perna esquerda, que foi forçada a fazer mais trabalho em corridas no sentido horário. Em resposta a essas preocupações, as autoridades atléticas tomaram medidas. Por volta de 1913, eles determinaram oficialmente que os eventos de pista seriam realizados no sentido anti-horário. Essa mudança rapidamente se tornou o novo ...

A genialidade não percebida

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Ele tinha dez anos. Chamava-se Joseph Brodsky e frequentava a escola na pacata cidade de Polyany, na Rússia. Ele a achava sufocante, enfadonha. O que nos recorda o personagem criado por Maurice Druon, Tistu. Ele aprendera as primeiras letras, as somas, subtrações e divisões com sua mãe. Quando o mandaram para a escola, o resultado foi lamentável. Quando começava o lento desfile das letras que caminham a passo pelo quadro-negro, quando começava a se desenrolar a monótona corrente dos três vezes três, cinco vezes cinco, sete vezes sete, ele caía no mais profundo sono. Tistu colecionou muitos zeros, recebeu reprimendas de toda ordem. Nada pareceu adiantar. Desistindo daquele aluno, o professor enviou uma carta ao pai: O seu filho não é como todo mundo, não é possível conservá-lo na escola. Para Joseph, o relatório escolar foi mais contundente. Foi qualificado como teimoso, preguiçoso e mal-educado. Não fazia os deveres de casa ou os fazia de qualquer jeito. Seus cadernos foram considerado...

Bob Fletcher. Uma história incrível de compaixão.

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  Enquanto os vizinhos eram levados para campos de concentração, ele cuidava das fazendas deles de graça, guardava seus lucros e enfrentava ameaças de morte. Quando voltaram, encontraram os pomares florescendo. Em 1942, os trens começaram a deixar os vales da Califórnia, levando milhares de famílias nipo-americanas para campos cercados por arame farpado sob a Ordem Executiva 9066. As casas foram lacradas. Os pomares silenciaram. Placas nas cercas diziam: “Evacuação Concluída.” Bob Fletcher, um jovem inspetor agrícola em Florin — uma pequena cidade ao sul de Sacramento —, ficou parado à beira da estrada vendo seus amigos e vizinhos desaparecerem atrás das cercas. A maioria deles era formada por agricultores — produtores de morangos, frutas e vegetais, descendentes de famílias que cultivavam o solo californiano havia décadas. Seu único “crime” era a ascendência japonesa — num país tomado pelo medo e pelo racismo após Pearl Harbor. Quando suas terras ficaram vazias, o mato começou a e...