Big Brother. Do vazio para o vazio

 


Há uma parte da população que passa horas a ver Big Brother como quem vigia um aquário: rostos presos numa rotina de nada, gestos repetidos, discussões vazias transformadas em espetáculo nacional. É uma escolha fácil, quase automática — uma fuga cómoda à exigência de pensar, sentir, questionar. Como se a vida alheia, reduzida a fragmentos de drama barato, pudesse preencher o vazio que cada um evita enfrentar dentro de si.


E o que acrescenta isto a quem vê?

Pouco mais do que uma sensação provisória de pertença, uma ilusão de importância no ato de julgar outros. É uma espécie de anestesia social: distrai, ocupa, mas não transforma. Alimenta-se da curiosidade mais básica e devolve apenas um espelho baço onde todos parecem iguais — cansados, previsíveis, desligados da própria consciência.


E o que diz isto sobre nós?

Diz que vivemos num tempo em que observar vidas vazias é mais fácil do que preencher a própria.

Diz que a superficialidade ganhou lugar de culto.

Diz que o público procura emoções rápidas, indignações instantâneas, heróis que duram o tempo de um episódio.

Diz que preferimos julgar do sofá do que enfrentar a nossa própria contradição.


A verdade é que estes programas não criam a sociedade — apenas a espelham, num reflexo ampliado e pouco lisonjeiro. Mostram a fome de validação, o prazer em ver o outro tropeçar, a necessidade de uma tribo, mesmo que fabricada. Revelam também a solidão de quem assiste, que encontra ali uma sensação provisória de companhia, como quem deixa a televisão ligada para não ouvir o silêncio da casa.


No fim, talvez estes programas sejam menos sobre quem lá está dentro e mais sobre quem está cá fora — sobre uma sociedade cansada, ansiosa, desconectada de si mesma, que procura distrações para não encarar o que realmente falta.


No meio disto, talvez seja importante lembrar que existem escolhas que acrescentam, em vez de nos apagar lentamente. Há coisas que nos tornam mais atentos, mais vivos, mais humanos.

Uma delas, curiosamente, continua a ser aquela que muitos fogem para não pensar tanto: ler.


Filipe Bacelo 



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