A Véspera Imóvel
Como escreveu Fernando Pessoa, às vezes nos sentimos como “na véspera de não partir nunca”.
A véspera imóvel
Há dias em que nos encontramos na véspera de não partir nunca. Dias em que o tempo se dobra sobre si mesmo, criando um intervalo suspenso entre o que já foi e o que nunca será. Não há malas para arrumar, nem bilhetes para conferir, nem rotas a seguir. A partida, que um dia pareceu iminente, dissolve-se em uma quietude quase impessoal, como se o próprio mundo tivesse esquecido de nos convocar.
É um estado peculiar, essa véspera sem destino. Não é a angústia do adiamento nem o alívio da chegada, mas um repouso sem entusiasmo, um intervalo onde o desejo de ir e a vontade de ficar se anulam mutuamente. Tudo parece estar decidido antes mesmo da escolha, como se já não houvesse necessidade de querer.
Não partir nunca significa perder a urgência das despedidas e o sobressalto das chegadas. Significa olhar para o horizonte e vê-lo imóvel, sem promessas nem ameaças. Nenhuma estrada chama, nenhum porto acena. O mundo segue o seu ritmo indiferente, e nós, por um instante, nos tornamos espectadores da própria inércia.
Mas há uma estranha paz nessa suspensão, um sossego que não precisa justificar-se. Quem já viajou demais, quem já se desgastou em expectativas, quem já traçou mapas apenas para vê-los rasgados pelo acaso, entende o alívio discreto de nada precisar mudar. A vida, por um instante, encontra um repouso involuntário, uma pausa na febre do movimento.
E, ainda assim, sabemos que a véspera nunca dura para sempre. Em algum momento, mesmo sem perceber, voltaremos a partir – nem que seja apenas dentro de nós mesmos. Pois ninguém permanece imóvel por muito tempo. O pensamento migra, os sonhos despertam, a inquietação nos alcança. E quando menos esperarmos, estaremos outra vez à beira do desconhecido, hesitando entre o medo da partida e a impossibilidade da estagnação.
Oliver Harden
Subscrito
Bonani
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